sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Saco- diálogo entre dois espermatozóides.

A sirene toca e todos saem em disparada. É um puxando o rabo do outro para conseguir chegar primeiro e coisa e tal.


Ele - Ei, você está muito devagar. Se não correr, não conseguirá chegar nunca.

Ela - Não faço muita questão. Nem sei o que tem lá fora. Vai que eu atravesse a fronteira e não goste?

Ele - Mas essa a vida minha filha. Tem que se atirar mesmo. Entrar de cabeça.O mínimo que pode acontecer é você não conseguir passar e, se passar, não conseguir voltar. Mas tudo bem. A vida é feita de riscos.

Ela - É, mas não estou disposta a correr risco. E outra, eu já sei o que vai acontecer,então, sem expectativas ok?

Ele - Sabe o que vai acontecer? Como assim?

Ela - Como, ”como assim” meu bem? Eu estou aqui há séculos sei muito bem como são as coisas. É por isso que deixei de correr. É uma vida muito incerta. Você já ficou sabendo de alguém que foi e voltou? Não. E tem também aquelas vezes que aquela bola luminosa lá não aparece,o povo corre no maior breu.

Ele - É verdade... sabe que um dia eu cheguei quase lá? Mas só foi o tempo de ver geral caindo no vácuo. Menina, mas eu sofri viu? Quanto mais eu corria pra voltar, mas aquela corrente me puxava e eu ouvia os gritos do povo caindo. Uma coisa. Fiquei traumatizado.

Ela - Tá vendo? Ainda corremos risco de morte.

Ele - Como é seu nome?

Ela - É melhor você correr senão não conseguirá chegar.

Ele - Ah, tudo bem, eu já perdi a corrida mesmo. É melhor ficar e conversar. Não vai me dizer seu nome?

Ela - -procurando disfraçar- Espermatozóida.

Ele - Oi? Eu não ouvi bem.

Ela - Espermatozóida!

Ele - Acho que você poderia falar um pouco mais devagar, eu não entendi muito bem.

Ela - Também, tem alguém ali fora que não para de gritar. Saco! Espermatozóida, pronto! E olha só, antes de você começar a fazer piadinhas sobre meu nome eu vou logo avisando que...

Ele - -interrompendo- Não, não. Relaxa. Eu nunca imaginei que iria encontrar alguém com esse nome.

Ela - Pois é, encontrou. Agora me deixa sozinha por favor.

Ele - Não, você não entendeu. Meu nome é espermatozóide. Eu nunca imaginei que iria encontrar alguém com o mesmo nome que eu...

Ela - Bem, que bom! Assim não pago mico sozinha né?

Ele – Pois é. Eu nem sei por que me colocaram esse nome. Afinal, nem conheço meus pais, não tenho parentes.

Ela- Eu também não. Aliás, você é a primeira pessoa que para pra conversar comigo por mais de dois minutos. Todos estão sempre correndo. HÁ pouco tempo atrás mesmo parou um cara, aliás, muito parecido com você, mas quando a gente ia começar a conversar, a sirene tocou e ele saiu correndo. É sempre assim. Nossos diálogos não passam de:- “Oi, você vem sempre aqui?- E logo saem correndo.

Ele- É verdade. A última pessoa que conversei também foi assim. Saiu para correr e nunca mais voltou.

Ela- É muito difícil criar um vínculo aqui dentro.

Ele- E você vem sempre aqui?

Ela- Ih, lá vem você com esse papo furado de todos. Meu querido, eu moro aqui, assim como você e todos que estão aqui.

Ele- É verdade... Às vezes eu esqueço.

Toca uma sirene.

Ela- De novo? Gente, esse homem não cansa.

Ele- Verdade. O que será que ele faz?

Ela- Ah, isso eu não sei. Ontem, eu sem querer, ouvi alguém falando lá fora : “– Vai, vai. Não para, não para-“ Acho que ele deve ser corredor ou algo assim. Só sei que, seja lá o que ele for, não pode parar jamais.

Ele- Será? Você já ouviu o tanto de grito, uivo, gemido que vem lá de fora? É uma coisa de louco. Boa pessoa ele não deve ser.

Ela- Bem, alguns de nós já quiseram pagar pra ver e o resultado foi trágico. O pior mesmo, é que a galera fica disputando para ver quem chega primeiro, mas o fim é sempre o mesmo. Ninguém volta, os que não conseguem entrar voltam com ar de derrotados, os que conseguem, não ganham nenhum prêmio. É tudo muito incerto. Não dá para arriscar.

Ele- Pois é. eu faço parte do time que nunca consegue chegar nem na metade do caminho. Sabe, eu já estou mesmo é cansado de ficar aqui dentro. Todo o dia a mesma coisa. Corre, volta, corre, volta. Não há muitas novidades, todos se vestem do mesmo jeito...preciso de novidade!

Ela- É. Também acho esse lugar um saco!

Ele- Sabe de uma? Quando tocar o próximo sinal eu vou com tudo. Vou me jogar, sem medo.

Ela- Bem, se você acha necessário passar por tudo isso, vai mesmo, se joga. Depois manda uma carta ou qualquer coisa dizendo como é lá.

Ele- Pode deixar.

Sirene toca.

Ele- Bem, lá vou eu...

Ela- Beijos. Vê se não some.

Ele- - correndo- Pode deixar!

Ela- É sempre assim. Quando acho que encontrei o cara da minha vida ele me larga por corrida. Ninguém quer compromisso sério hoje em dia. Acho que vou ficar pra titia. Saco!

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