quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Alma vazia, closet cheio. - um monólogo.

Ato único:

De um lado da cena, quatro cadeiras, todas com vestidos e sapatos. Em outro lado, um espelho e uma cômoda com perfumes, rosas murchas e maquiagens. No meio, Ana está sentada, abraçada a um vestido tomando vinho. Ela deve estar completamente desarrumada, com os cabelos bagunçados e maquiagem borrada.

ANA- (falando com as roupas) - Estão vendo? São todas compradas nas mais caras lojas da cidade. Hoje, alimentei meu ego comprando as mais caras roupas das grifes mais famosas da cidade. (pega um vestido) – Esse, acho que vou deixar para usar...(olha para a platéia, volta, vai até outro vestido) – Este, vou usar no evento... (mesma ação anterior).

Ana olha para as roupas e aos poucos vai voltando o olhar para a platéia- 4ª parede.

ANA- Há quanto tempo eu não sou convidada para uma festa? (voltando a si)- Bem, não importa tanto. Para quê está no meio de tanta gente medíocre que mal chega aos meus pés quando eu posso estar aqui. Com as melhores roupas, os melhores sapatos.

Ela vai até um par de sapatos e os veste. Tira-os, coloca outro. Faz esta ação algumas vezes.

ANA- Droga. Já usei todos esses sapatos. Preciso sair para comprar mais. Talvez se eu combinar com outras bolsas...

Ela pega algumas bolsas, vai até o espelho, se olha. Experimenta mais bolsas.

ANA- Essas bolsas eu já usei. (alerta) – Jóias! Acho que pode ajudar a disfarçar...

Novamente ela levanta e vai até uma caixa de jóias. Poe algumas, tira insatisfeita. Executa estas ações mais algumas vezes.

ANA- (Já alterada) – Que merda! Nada combina com nada. Preciso sair para fazer mais compras. (se olha)- Mas não com essas roupas.

Música. Ana experimenta vestidos, sapatos, bolsas e jóias. O ritmo da cena vai se tornando frenético até o ponto dela dar um grito.

ANA- Não tenho nada! Olho em volta e só vejo um monte de coisa usada que não me serve para nada. Estou sem roupa. Sem sapatos. Sem nada! (...) Já sei. Acho que vou naquela loja...(olha para a platéia) – Não. acho melhor ir naquela loja... (mesma ação) – Acho que não vou a loja alguma. Que horas são?

Ela revira as roupas freneticamente atrás do relógio.

ANA- Que horas são? Alguém sabe que horas são? (pergunta para as roupas) – Vocês... vocês sabem que horas são? Há quanto tempo estamos aqui? (olha para a platéia) – Onde estamos? Onde estou?

Musica. Ela olha para os lados e percebe-se só.

ANA- Vocês não me respondem nunca! Nunca! Vocês apenas me ouvem. Não me contestam, não opinam. Parece até que não existo para vocês. Eu escolhi vocês... cada uma de vocês. Sempre que ele não vinha, sempre que cada um me virou as costas, eu escolhia vocês. Eu elegi vocês para viverem meus momentos junto comigo e o que recebo é isso? Desprezo? (...) Desprezo... As pessoas me desprezam pelo fato de eu ser diferente. Essa pele... esse cabelo... por mais que eu faça não consigo me livrar deles...

Ela se olha no espelho da cabeça aos pés. Pega um vestido no chão.

ANA- Você lembra aquele dia que ele marcou comigo no restaurante? Como me enfeitei para ele? Você lembra quantos outros vestidos vesti até encontrar você? Depois de horas me produzindo, me arrumando, quando cheguei lá, ele não estava mais... depois nem quis saber mais dele. Ele se foi, mas você continua aqui.

Olha para em volta, para todas as roupas jogadas pelo chão.

ANA- Aliás... todos vocês! Todos se foram e vocês continuam aqui. E sabe? Eu não preciso de ninguém mesmo. Tendo vocês já me basta. Nunca que vou trocar o prazer de comprar um belo par de sapatos por uma noite de sexo ou de conversa fora com amigas idiotas. E no mais... quando não estou coberta por vocês, deixo exposta essa pele...

Ela se toca enojada. Se olha no espelho e se encara por um tempo

ANA- Preciso fazer compras. Preciso preencher este vazio.

Ela faz menção de ir á platéia, volta, vai para outro lado. Percorre todos os lados da cena. Desespera-se.

ANA- Estou trancada! Trancada em um lugar no tempo que mal sei qual é. Há quanto tempo estou sozinha aqui?

Ela vai até as roupas e as organiza.

ANA- Não estou só. Tenho vocês. Esperem um pouco que vou colocar uma música. Não saiam daí.

Ela põe uma música e começa a dançar pela cena. Pega alguns vestidos e dança com eles. Coloca sapatos, tira, põe bolsas,jóias, olha para o público, para o espelho. Repete essas marcações enquanto a luz vai fechando

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