terça-feira, 20 de dezembro de 2011

A dança dos quatro ventos. Capítulo II- A adorável desconhecida.


(...)

O olhar penetrante daquela mulher deixou Gaudêncio impressionado. Era capaz de ver o mundo através dos olhos dela. Por um instante, o tempo parou, tudo estatizou e em meio a grande poeira, as silhuetas dos dois pareciam uma miragem.

A desconhecida levanta a garrafa e com ar provocativo, arqueia a sobrancelha direita e da um sorriso de canto de boca. Bate com o pé esquerdo no chão e um tango triste começa a tocar. A mulher dança graciosamente, parece levitar pelo espaço. Gaudêncio tenta manifestar alguma reação, mas mal consegue se mexer tamanho o seu encantamento.

Ao mesmo tempo que se deixava enfeitiçar pela graça daquela adorável desconhecida, algo dentro dele lhe pedia para tomar cuidado. Os seus olhos se alternavam entre os olhos, o corpo e a mão dela, que segurava a garrafa com graciosidade. Até então, a arte de colher ventos e guardar em garrafas era apenas sua e do seu avô. Como será que aquela mulher descobriu o ponto onde a estrada se divide? Como ela sabe da dança dos quatro ventos? Quantos ventos ela já colheu?

A música para, os ventos voltam a dançar furiosamente. Os cabelos da mulher batem em seu rosto, deixando a mostra apenas metade do mesmo. Com os olhos semi fechados devido à poeira, ele a encara profundamente, numa distância de dois metros.

- Quem é você? –disse ele.

Ela deu uma longa gargalhada, passou as mãos pelos cabelos e se aproximou. Gaudêncio não podia negar que aquela mulher era extremamente apaixonante. Como uma espécie de feitiçaria, os olhos dele não conseguem se desviar dos dela. Com os cabelos dançando com os ventos, ela para alguns centímetros a sua frente.

- Por que você quer saber? – disse.

- Você sabia que esse lugar é meu e do meu avô? Que a arte de colher ventos é apenas nossa? Quem te autorizou a invadir o meu território?- a voz dele estava trêmula.

- Está nervoso meu rapaz? Calma. Não vim invadir o seu espaço nem roubar o que é seu, vim aqui apenas pegar o que é meu.

- E o que é seu?

- É isso que pretendo descobrir. Quem sabe se o que entrar nessa garrafa passe a ser meu à medida que me identifique com o que colhi?

- Você colhe ventos a quanto tempo?

- Depende. O tempo que para mim pode ser muito para você pode ser quase nada. Eu colho ventos por que procuro uma história em especial. Já você...

- Eu colho por que gosto de ouvir o que eles tem para me contar.

- Não! Você os colhe por que não tem história própria . Porque não tem identidade. Porque para você é mais fácil colher histórias que plantar as próprias. Desde que você aprendeu a colher vento, você esqueceu do principal: construir a sua vida, a sua história.

- E quem você pensa que é para me dizer o que faço ou deixo de fazer? Você nem me conhece.

Ela se aproxima dele e os dois ficam face a face.

- Eu conheço mais você do que você imagina.- ela lhe dá um beijo e os dois dançam em meio ao redemoinho.

Continua...







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