quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Jovens- Capítulo I



 Capítulo I


Ju está completamente aérea. Júnior, o garoto de dois anos que ela cuida chora compulsivamente, mas ela parece alheia ao choro dele. Na noite passada ela teve uma conversa definitiva com Márcio sobre o relacionamento dos dois. Achava um absurdo ele impor a ela que se não houvesse sexo não haveria mais namoro. Ela ainda não se sente preparada para isso, afinal, eles só estão namorando há dois meses. Mas ao mesmo tempo, se ela não transar com ele, pode perder aquele que ela acredita ser o homem da sua vida. O que fazer? Ela pega Júnior no colo e o sacode de leve, acalentando para que ele se acalme.

- É por essas e outras que não penso em ter filho. Criança chorando toda hora no pé do seu ouvido é um inferno. – pensou.

Marta, a mãe do menino chegou, finalmente está liberada para ir embora. Agora, é só subir para o curso de secretariado que faz à tarde. Antes de ir, vai ao banheiro,molha o cabelo e se olha no espelho. A raiz do cabelo começa a ficar crespa de novo e ela não vê a hora de receber para comprar o produto. Uma espinha bem na testa a incomoda profundamente. Tira o blusão que usava e põe um tomara que caia, mostrando a barriga sarada (resultado de horas sem comer). Brilho nos lábios e está pronta. Liga seu celular e coloca sua música preferida, MC Janny. Na descida da rua, ouve o “E ai gostosa”, do rapaz que vende DVD. Enquanto espera o ônibus, pensa em uma solução para a noite. Será que se entrega hoje mesmo a Márcio? Ele já disse que, quando ela quiser a casa dele está livre, afinal, mora sozinho. Quando chegar ao curso vai conversar com Denize, sua colega de curso. O ônibus para a General Alvim passa lotado e ela resolve esperar o próximo. Não quer ir em pé. Logo não demora e passa o 135, que passa perto do curso e ela resolve pega-lo. Logo que entra, o rapaz que está sentado no banco do meio, Sandro, a olha com desprezo. No seu pensamento, tem apenas o desejo de que ela não sente do seu lado. Seria insuportável fazer a viagem inteira ouvindo funk ao lado de uma menina tão vulgar. Mas o seu desejo não é atendido e como se parecesse provocação, ela senta ao seu lado e ainda joga o cabelo molhado no ombro dele. Ela o observa e decide puxar assunto.

- E essa bíblia ai no colo? Você né muito novo pra tá pregando não? – diz ela.

Sandro a ignora e olha pela janela.

- Entendi, não quer conversa.- ela põe o fone de ouvido e “derrete” no banco, ficando quase deitada.

(...)

Sandro, se distraí com a paisagem e esquece que ela está do seu lado. Ele abre a mochila para dar mais uma revisada no trabalho da escola e ver se não falta nada. Passou a manhã inteira fazendo trabalho de geografia e ainda colocou o nome de André, seu melhor amigo. Está acostumado, sempre faz os trabalhos sozinho e coloca o nome dele. Faz isso por amizade. E por amor. Gosta de André desde os 12 anos, quando começaram a estudar juntos. Ele sente uma afinidade muito grande, por terem a mesma idade e a mesma religião. O pai de André é pastor e as famílias são amigas, afinal, os pais de Sandro freqüentam a igreja do pai de André. Ainda hoje pela manhã enquanto fazia o trabalho, lembrou dele. Do seu sorriso, do seu jeito aéreo de ser... é impressionante como tudo nele o encantava. Mas esse é um tipo de paixão proibida. Primeiro, por ser ele um menino e depois, por serem evangélicos. Logo ele pegou a bíblia e foi ler os Salmos. Deus deveria castigá-lo só por pensar assim, mas não tem culpa, é algo mais forte que ele. Quem sabe isso uma hora passe? Aliás, tem que passar. Nunca haverá nada entre eles. Nunca.

Ju levanta rápido e dá sinal, quase perde a parada.

- Foi um prazer hem?- disse a Sandro e desceu correndo.

O ônibus seguiu e Sandro levantou, sua parada era a próxima. Qual não foi sua surpresa ao perceber que Ju havia deixado cair a foto de Márcio. Imediatamente ele a pegou e guardou no caderno. Como volta e meia a vê no ônibus, assim que encontrá-la novamente irá entregar a ela. Desceu e passou no supermercado que fica ao lado da escola. Sempre passa lá para comprar o biscoito e o suco do lanche.

– Ei, você vai levar de morango hoje?- a voz era de Erick, o empacotador.

- Vou sim... cansei de comer só chocolate sempre. Cansa né... fazer sempre a mesma coisa, comer sempre a mesma coisa...!- disse Sandro.

- É verdade...tem que varia de vez em quando.- Erick olhou nos olhos de Sandro que, tímido, os desviou de imediato e saiu, quase que correndo. Por que será que este rapaz mexe com ele? Sempre fica nervoso só de ouvir sua voz. Bem, era melhor não pensar nisso. O guarda já está quase fechando o portão quando ele passa em disparada e adentra a escola.

(...)

Erick, o empacotador do supermercado é chamado na gerência.

- Então rapaz... já faz três meses que você tá aqui com a gente. Por enquanto não tenho o que reclamar do seu serviço- disse Mário, o gerente do supermercado. – Você tem vontade de crescer na empresa?

- Quem não tem senhor?- respondeu.

- Bem...- Mário pigarreou- O Fábio, repositor do segundo turno pediu demissão, arrumou outro emprego. Está sobrando essa vaga. Como eu já venho observando o seu desempenho, acho é ideal pro serviço.

- Eu?- Erick abriu um longo sorriso.

- É... acho que vai se dar bem. E olha, o salário é bem melhor viu? E ainda tem adicional noturno, já que o trampo é das 15:00 às 23:00hs. Você começou como menor aprendiz, mas pelo que sei fez 18 anos agora não é?

- Faz quinze dias...- Erick sentia seu coração querendo sair pela boca. Não acreditava que finalmente teria seu primeiro emprego.

- Então rapaz- Mário deu um tapa de leve nas costas de Erick- É uma grande oportunidade...

- É verdade seu Mário. Só tem um problema.

- Problema?

- É que eu estudo a noite e na minha escola só tem ensino médio à noite... e agora a gente já tá em Setembro... eu não vou conseguir mudar de escola...

- Bem rapaz- Mário sentou-se em sua cadeira e cruzou as mãos.- Isso é algo a se pensar, do seu lado claro. Eu não vou poder esperar, vou ter que colocar alguém, se não for você, será outro... acho que se você perder esse fim de ano não vai ser de grande mal. Perde, ano que vem você começa de novo, em outra escola.

- Mas...- Erick quase chora.- É que estou no fim do ano. A gente tá até planejando a formatura.

- É... complicado! – disse Mário- Mas não posso fazer nada. Vou te dar até amanhã pra você pensar então. Mas de amanhã não passa.

Erick desceu as escadas quase sem perceber. Mil coisas começaram a passar por sua cabeça. Deixar a escola não seria nada bom ,mas, deixar uma oportunidade como essa também não é legal. Afinal, não quer ser empacotador pro resto da vida. E no mais, teria seu primeiro emprego fixo e poderia quem sabe dessa vez, ser motivo de orgulho para sua mãe. Seu turno acaba e ele vai embora.

(...)

Sandro chega em casa triste. Deixa os materiais sobre a mesa da sala e vai procurar algo para comer antes de começar a estudar pro teste do dia seguinte e fazer os deveres de casa. O dia na escola foi péssimo. Lava as mãos e começa a preparar um sanduiche.

- Sandro, como foi na escola hoje?- a voz que vinha da sala era da sua mãe, Dora.

- Ah, foi normal mãe. Só com muito trabalho pra fazer.

Ele dá uma bocada no sanduiche e vai comendo, enquanto segura um copo de suco na sua mão. Ao chegar à sala, sua mãe o encara profundamente.

- Quem é Márcio?- disse ela com voz dura.

- Márcio?- disse Sandro tão assustado que quase engasgou com o sanduiche.

- Que negócio é esse de você andar com uma foto de um homem se camisa dentro do seu caderno, Sandro? Eu espero que você tenha uma boa explicação para isso!

(...)

Ju passa em casa rápido, toma um banho, come algo rápido e corre pra a escola.

- Toda essa pressa é pra não chegar atrasada é?- disse Juscilene, sua irmã, com ar debochado.

- Cala a boca vadia!- Ju mostra o dedo médio para ela e sai.

Ju está decidida. Ao chegar na escola ela vai na sala de Márcio e vai dar o veredito final. Hoje, ela se entrega a ele, está decidida. Depois de conversar com Denize, ela percebeu que essa é a melhor alternativa. Denize, sua colega de curso tem 16 anos, já mora junto com um rapaz e está grávida de quatro meses. Apesar de ser nova, tem sua casa e não depende mais dos pais e isso é o que Ju busca para sua vida, sair da casa dos pais. Quem sabe se entregando a Márcio ele decide chamá-la para morar com ele e finalmente ela se verá livre da chata da Juscilene e das implicâncias de sua mãe e seu pai.

Ela atravessa a rua tão rápido que quase é atropelada. A primeira aula já começou e ela vai direto para a sala de Márcio.

- Ele não veio hoje. E o que você faz fora de sua sala?- disse a professora.

Ju dá de ombros e parte para a entrada. Vai até a casa de Márcio. Será até melhor, assim as coisas ficam mais fáceis. Na entrada, Fabiano, o coordenador a interrompe.

- Onde a senhora pensa que vai? O portão já fechou. Ninguém nem sai, nem entra. – diz ele.

- Libera ai vai Fabiano. Minha menstruação desceu e eu não trouxe absorvente. Não tem como assistir aula desse jeito.

- Juliana... quantas meninas você acha que me dão essa desculpa todos os dias?

- Mas não é desculpa Fabiano. Se você quiser eu posso tirar a calça aqui e mostrar pra você e pra todo mundo, você quer?

Uma das manias de Ju é de ser extremamente desaforada e briguenta. Fabiano sabe disso e para evitar problemas, prefere deixa-la ir embora.

- Obrigada professor. –diz ela dando-lhe um beijo no rosto.

- É coordenador Ju. Coordenador.- ele balança a cabeça e dá de costas.

-Ainda bem que Márcio mora só a duas ruas da escola, assim não precisa andar tanto- pensa.

Ju chega a casa de Márcio e bate palmas. Faz isso por três vezes até que ele aparece só de shorts.

- Você nem foi pra escola hoje... resolvi vim aqui fazer uma surpresa- disse ela.

- Pois é- Márcio coça a cabeça- Eu tava muito cansado do trampo, nem deu pra ir.

- E você não vai me chamar pra entrar?

- É melhor não amor... eu tô muito cansado, quero dormir mais cedo hoje.

- Poxa... mas eu fico só um pouco e vou embora então... tive que matar aula pra vim pra cá.

- Márcio... que é?- Grita uma voz de dentro da casa.

- Márcio... de quem é essa voz- diz Ju dando um passo a frente.

Marcio a interpela com a mão, mas não consegue falar nada.

- Márcio, eu te perguntei de quem é essa voz...

Diante do silencio de Márcio, num rompante, Ju o empurra e entra na casa. Lá, é surpreendida por Jane, colega de sala de Márcio, de calcinha e sutiã em seu sofá, vendo TV.

Ju respira ofegante e seus olhos ficam vermelhos de fúria.

- O que essa piranha,desgraçada tá fazendo aqui?



Continua....

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